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Entretenimento Quarta-feira, 19 de Novembro de 2025, 17:05 - A | A

Quarta-feira, 19 de Novembro de 2025, 17h:05 - A | A

ARTESÃ DO SABOR

A doce história de ‘Célia da peta’, guardiã da memória e dos sabores de Iraquara

DA REDAÇÃO

“Eu aprendi com minha mãe ainda muito pequena, sabe? Minha mãe sempre fazia para nós nas festas juninas. Ela tanto fazia o avoador, como fazia a peta. A peta ela sempre fazia com o nome da gente [desenhava o nome]”, diz Maria Célia Chaves, que comercializa a peta na cidade de Iraquara, na Chapada Diamantina. Peta é uma espécie de biscoito leve, crocante e oco por dentro, à base de polvilho, que também leva ovos, leite, sal e óleo.

Célia carrega o sabor da memória nas petas, ensinadas pela sua avó e pela mãe. Mulher do interior, ela é uma das ‘mestras do saber’, retratadas na websérie “Anfitriãs”, roteirista, diretora e atriz Ludimila Agostinho, que documenta a vida de jovens artistas e mestras guardiãs da memória cultural em várias cidades da Chapada Diamantina.

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“Quando a gente fala de ‘Anfitriãs’, estamos falando de mulheres que abrem suas portas com muita receptividade, com muito carinho, com muita atenção e generosidade. E a cozinha é esse lugar de intimidade, mas também um lugar de resistência, assim como também os seus altares, que é um lugar de muita sutileza e permanência dos saberes”, relata a diretora.

Dentre as guardiãs que participam da websérie, também está Janete Maria Maciel Matos Lima, que faz um doce de leite famoso pela originalidade. Ela cria uma base tradicional mas adiciona frutas, tornando o doce um dos mais saborosos. Como a maioria dos cozinheiros, Janete aprendeu a fazer a iguaria com a mãe.

“Olha, eu aprendi a fazer doce de leite com minha mãe. Eu já nasci com ela fazendo doce e a gente, desde criança, começou ajudando”, conta a doceira.

Já Célia, exibe seus dotes culinários e, sobretudo, sua alegria ao narrar peculiaridades da sua vida cotidiana na cidade de Iraquara, terra onde viveram seus avós e seus pais, que lhe deixaram uma memória afetiva de alegrias e sabedoria.

“Foi uma infância maravilhosa. Nossos pais foram dois guerreiros nas nossas vidas. Meu pai era analfabeto e minha mãe sabia ler e escrever. Meu pai falava: ‘Vocês não carregam a morte na gibeira, meus filhos! E nem vou deixar vocês como uma árvore sem folha’. E, realmente, ele morreu, mas deixou todo mundo amparado. Maravilha, só tenho que agradecer os ensinamentos do meu pai e da minha mãe”, diz com gratidão e muita emoção.

Além dos filhos e dos netos, o eixo da vida de Célia são as famosas petas, uma iguaria tradicional nordestina, popular também na Bahia.

“Olha, minha filha, é uma felicidade que não tem nem como explicar. É aquele prazer, aquela vontade e aquele… sabe? Aquela fé em Deus, primeiramente. Senhor, põe teus anjos aqui! Não deixa minhas petas estourarem, faça as petas!”, clama, com muita fé.

Imagem ilustrativa da imagem A doce história de ‘Célia da peta’, guardiã da memória e dos sabores de Iraquara
| Foto: Divulgação

As petas são a paixão dessa iraquarense magrinha e agitada, que comercializa a iguaria desde 2002, e para quem as petas são uma bela herança deixada pela avó e pela mãe.

“Para mim, representa uma herança, uma coisa assim de raiz, sabe? Eu fazia peta lá em praça pública. Tinha gente de todo lado olhando. Eu ia, colocava massa, colocava tapioca, escaldava, fervia no fogão à lenha e o pessoal formava fila. Minha filha, tinha que pegar o nome das pessoas porque eu não dava conta! Ninguém fazia massa igual à minha. Eu ia fazer a massa lá, ao vivo e a cores, no meio da praça, no Forró do Roque de Iraquara”, conta.

O Forró do Roque fez história nas memórias afetivas de Célia. Eram 24 horas de forró com Célia no fogão à lenha, uma atração à parte nos festejos juninos. De peta à feijoada e ao milho assado na brasa, era muita comida para um público satisfeito e brincalhão. Lá, as petas dela brilharam!

Minha barraca era assim, ‘Célia da Peta’! Eu sempre vendo elas nas festas juninas. Eu não dou conta: é fazendo e fritando na hora! Faço no meu fogão à lenha, lá no meio da praça, no meu fogão de assar meu avoador também. Eu mesma que faço: bato o barro, faço tudo.”

O domínio de Célia vai muito além de fazer a peta. Ela própria, sempre que havia oportunidade, como no São João, no famoso Forró do Roque da cidade, fazia o seu fogão de barro, como ela gosta de contar.

Imagem ilustrativa da imagem A doce história de ‘Célia da peta’, guardiã da memória e dos sabores de Iraquara
| Foto: Divulgação

“Minha mãe sempre gostava de rebocar o fogãozinho dela com barro da areia da estrada porque era um fogão feito de adobe mesmo. Às vezes, era com quatro forquilhas, a caminha de vara, meu pai colocava e enchia de terra, depois colocava barro, fazia ali o lugarzinho da panela e pronto. Eu lembro que ela me chamava: ‘Célia, vamos lá, vamos raspar [a terra] ali pra gente rebocar o fogão’”, conta.

Quando Célia fala sobre a peta é com tanto sabor nas palavras que logo dá vontade de experimentar a iguaria. Parece que a peta funciona como a pipoca e o amendoim: basta comer um único grão para que dispare uma vontade de esvaziar uma panela inteira. A peta é desse jeito.

“A peta é um prato que você vai fazendo e vai comendo, vai fazendo e vai comendo. Tenho prazer em fazer o que Deus me ensinou. Quanto mais você vai fazendo, mais você vai aprendendo, você vai aperfeiçoando. Você vai gostando de fazer. Eu gosto de amassar minha peta no calumbé de pau”, conta e explica o que é calumbé.

Imagem ilustrativa da imagem A doce história de ‘Célia da peta’, guardiã da memória e dos sabores de Iraquara
“É uma bacia de madeira, um calumbé. Pirão de calumbé você escalda já no calumbé, no prato de madeira. Aí chama pirão de calumbé”, explica. Vixe, que susto! Está explicado.
 

Alguns dicionários informam que calumbé é uma vasilha de pau de origem indígena; outros dizem que é uma vasilha ou gamela cônica para conduzir o cascalho à lavagem, nas catas de ouro ou diamantes.

Depois de amassar as petas na gamela de madeira, Célia diz que gosta de cozinhar, sabe onde?“Na panela de pressão.” É a panela de pressão que traz grandes lembranças da cozinheira, quando, um dia, o pai levou para casa esse equipamento tão necessário na cozinha. O caso da panela de pressão tornou-se um dos episódios mais marcantes e engraçados na juventude de Célia.

“Meu pai trouxe uma panela de pressão e colocou lá no meio da casa e falou que dava uma novilha para quem acertasse destampar. Eu lembro da panela de pressão como hoje. Tinha uma tampa verde com dois pinos e ninguém acertou destampar. Aí tudo bem, né? Ele ensinou para a minha mãe”, narra a história.

“Quando foi meio-dia, minha mãe botou uma galinha para cozinhar. Ah, minha filha… como é que destampa agora a panela? Chique, chique, chique”, Célia imita o som da panela no fogo. “Meu pai disse: ‘Espera aí, calma aí. Tira a panela do fogo!’ Aí ele tira a panela do fogo com a ponta do facão… ô menina… quando suspendeu esse pino, a panela fez… xiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii. Ele bateu os dois pés no chão e disse: ‘Corre, meus fios, que sua mãe tá doida!’ Nós éramos oito filhos, viu? Um pula pela janela, outro saiu embaraçando uns nos outros na porta”, detalha as belas lembranças de menina.

Às gargalhadas, Célia prossegue com sua saga. “Meu Deus do céu! E aí painho se acabou de rir. Minha mãe: ‘Você assombrou meus filhos, você assombrou meus filhos!’ E nós saímos tudo correndo. ‘Corre, meu filho, que sua mãe tá doida!’ Isso foi um sarro na nossa infância com essa história da panela de pressão. Mas foi muito maravilhoso”.

E depois dessa bela história, Célia vai nos brindar com a peta que tanto faz sucesso em Iraquara.

Veja o vídeo no link abaixo

https://atarde.com.br/colunistas/historiasesabores/a-doce-historia-de-celia-da-peta-guardia-da-memoria-e-dos-sabores-de-iraquara-1366709

Peta

  • 1 litro de tapioca
  • ½ copo de óleo
  • 2 copos de água
  • 2 ovos
  • Sal à gosto

Coloque a água para ferver com o sal e o óleo.

Em uma vasilha, de preferência em uma gamela de madeira, despeje a tapioca e vá misturando o sal e o óleo. Uma parte ficará mais molhada, e a outra será umedecida com os ovos.

 

Mexa com as mãos, quebrando os ovos aos poucos e trabalhando a massa até que ela solte das mãos.

Depois, é só enrolar e fritar em óleo morno (não muito quente, para não estourar).

Sirva quente, com café ou chá.

Segredinhos:

Não se deve colocar o sal direto sobre a massa; ele precisa estar na água usada para escaldar a tapioca. Depois de escaldar, a massa não deve ficar totalmente mole. A partir daí, você vai dando o ponto com os ovos, quebrando e misturando um a um. Todo o processo é feito à mão, trabalhando bem a massa até atingir a consistência certa.

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